Espelho, espelho meu – Crônica de Fran Rezende
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Caraca! Acho que nem entro mais nessa calcinha M. É, tá meio apertada. Mais um pouquinho, só mais um pouco, ufa, serviu. Eu preciso parar com essa mania de querer me enfiar nas roupas de antes. Preciso assumir o G, pelo menos por enquanto. Olha só… Minhas coxas agora se encostam, já não tenho mais o temido “escapa gato”. Tá aí uma coisa legal: pernas grossas. Gostei. Mas e esse pé de pão italiano? Isso não me pertence. Sapatilha nem pensar, salto alto, sonho meu. O que vai ser? Havainas? E essa papada? Aff Maria, eu só posso estar inchada. É, só pode ser isso. Tá muito calor. Cadê o meu creme milagroso? Eu coloquei aqui em cima… Ah achei. Um pouquinho na mão, movimentos circulares. Ui ui ui, sem coçar, sem coçar! Concentração: 1,2,3. Ai, passou. Eita! Que aflição desse umbigo! Parece até que vai rasgar de tão es-ti-ca-do. Espera! Para tudo! Isso é uma estria? Não, não, não! Não pode ser. Esse espelho só pode estar sujo. Ferrou, nada de sujeira. E não é uma estria, são duas!

_ Amor, você já está pronta?

_ Não. Não estou pronta agora e nem nunca.

_ O que foi minha vida?

_ O que foi, o que foi! Olhe pra mim e você vai entender o que foi, o que está sendo e o que vai ser!

_ Ih, mais uma crise.

_ Sim. Mais uma crise. Por quê? Você quer trocar de lugar? Assumir o meu corpinho de 20 quilos a mais? Segurar esse peso todo e andar igual a uma pata? E não entrar mais em nenhuma roupa? E não conseguir nem amarrar a porcaria do sapato? Ah!! E já estava me esquecendo. Que tal essas estrias hein?? Legal ficar com essa tatuagem horrorosa pra sempre no seu umbigo, né?

_ Amor, não chora. Vem cá.

_ Sai! Não quero olhar pra você. Você é um ignorante, troglodita e machista. Nunca me entende. Tá sempre me criticando. Quer saber de uma coisa? Eu não vou sair nunca mais de casa. Vou ficar aqui pra sempre. Mofando.

_ Mas meu dengo, você não estava com vontade de comer lasanha? Vamos lá, se anime, eu reservei aquele restaurante da Bela Vista que você ama.

_ Ha Ha Ha! Eu estou aqui despejando a minha fúria sobre esse corpo que eu não sei aonde enfiar e você vem me falar de lasanha? Tá vendo como você não me entende? Depois de comer uma lasanha eu vou explodir igual a Dona Redonda.

_ Dona redonda? A da minissérie? Hahahahaahahhahahahahaha

_ Hahahahahahahahahahhah Roinc Roinc

_ Amor, você fez porquinho?

_ Ahn?

_ Você fez Roinc Roinc quando riu.

_ Não fiz nada.

_ Fez sim, hahahaha. Que linda!

_ Linda? Você não tem noção? Ai… Você me destrói e acaba comigo. Já estou me sentindo horrorosa e você ainda me chama de porca?!

_ Ei, eu não te chamei de porca.

_ Chamou sim. E se por um acaso fiz porquinho foi porque tá tudo apertado aqui dentro. Todos os meus órgãos estão embalados a vácuo. Aposto, você não leu um email do Baby Center. Só pra constar, te encaminho toda semana, viu? Deve ir direto pra lixeira. Se tivesse lido entenderia como fica o corpo da mulher e não me chamaria de porca.

_ Ai amor, esses emails são chatinhos né? Desisti logo no primeiro. Aonde já se viu? Comparar meu filho a um caroço de abacate?

_ Insensível! Ogro! Você vai ser um pai desleixado, tô até vendo.

_ Quer saber? Eu sou um trouxa. Não quer ir não vai. Já deu. Você precisa pensar um pouco em mim também. Eu estou sendo até muito paciente com todas as suas crises. Já cansei de te dizer o quanto está linda e que todas essas mudanças no seu corpo são por uma causa maravilhosa, são pelo nosso milagrinho, nosso filho. Por favor, pense nisso quando quiser acabar com as nossas noites.

Ui, essa doeu.

_ Desculpe amor. Eu exagerei. Espera na sala, eu me arrumo em 2 minutos. Visto um vestido preto que disfarça tudo. Só um instante.

_ Nada disso. Agora quem não vai sou eu.

_ Não! Vida, amor…

Ai como sou idiota. Eu tenho um marido lindo, que me ama e é louco por nosso filho. Tadinho. Ele reservou um restaurante italiano, o mais bacana de São Paulo. Como fui má. Depois ele desiste de mim, se separa e aí como eu fico? Sozinha no mundo com uma criança sem pai? Nossa Senhora das grávidas arrependidas, me ajude a consertar toda essa meleca. Pensa, pensa, pensa… Já sei! Se vamos ficar em casa, que tal uma noite de amor? Hum… Faz tempo… Será? Vou deixar ele feliz? Claro né. Qual homem não ficaria? Só preciso achar uma camisola. Opa, essa rosa é linda e soltinha. Adoro rosa. O barrigão deve caber aqui. Como pensei: perfeita! Um perfuminho: pescoço, pescoço, pulso, pulso. Agora esse rob por cima, faz um laço, e pronto!

(…)

_ Amor…

_ Oi, tá mais calma?

_ Sim. Já passou. Vim pedir desculpas.

_ Tá desculpada vida.

_ Ei, larga o videogame e olha pra mim.

_ Hum, que linda com esse roupão.

_ É um rob de seda amor. Larga esse controle!

_ Pronto. Agora sou todo seu.

_ Tá vendo esse laço? Tô embrulhadinha pra você. Vai, desembrulha e pegue seu presente!

_ Nossa! Um presente e nem é natal. Vou abrir esse pacote bem devagarinho…Tira um laço, tira o outro e… Olha só! Ganhei uma PEPPA!!!

_ Hahahahahaha roinc roinc

_ Hahahahahaha! Vem cá minha PEPPA momozinho…

Por Fran Rezende, do blog Fran Miss Mãe